Moldando Caprichos

on quarta-feira, 27 de novembro de 2013
Acho impressionante a volubilidade que o ser humano é capaz de depreender as coisas ao seu derredor. Sério, acho incrível como ele pode mudar radicalmente a funcionalidade e até mesmo a finalidade de certas coisas. Para o bem e para o mal, mas até isso ele consegue deformar, o sentido de ética e princípios morais dependendo da veemência pode parecer como a retidão de uma linha de um escritor com Parkinson.
 
Furar uma fila pode parecer corretíssimo aos olhos de alguém que ache que porque tem só um item tenha preferência no mercado, na vida, em tudo. Os automóveis já deixaram de ser veículos que transportam indivíduos do ponto A até o B e mesmo a fútil utilização do carro como firmeza moral e compensatória do órgão fálico gigante já estão em desuso. Hoje em dia o veículo é uma arma. Disparada pela eufórica pressa do cotidiano e pela falta de modos geral um Corsa produzido em série em mãos erradas pode matar tanto quanto uma pequena guerra. Não é uma bomba atômica ainda, mas uma bomba-relógio, que apita para explodir a medida que o tempo se torna mais escasso nas grandes metrópoles. Daqui a pouco teremos que pedir porte de arma e não mais cadastro no DETRAN.
O celular já virou mascote. Mais que isso: da família. Nossas mãos tremem quando percebemos que o apetrecho tecnológico sumiu de nossa vista, de nosso bolso. Suamos em bica. Sentimos o vomito na portinha. Então respiramos aliviados quando percebemos que ele está bem em nossa frente na mesa de trabalho ou mesinha do nosso quarto, refletindo uma luz fria e debochada. Está em minhas mãos, certamente deve pensar o objeto. É a amante do século XXI. Livros viraram engodos para mostrar o quão letrado uma pessoa pode ser mesmo que as estantes conservem os moldes das brochuras em monumentos de poeira. O amor pode ser cárcere e o sexo pode ser banal perdendo qualquer característica especial. Temos uma maneira bem peculiar de ver o mundo e a natureza TEM que se adaptar aos nossos caprichos. Micos, Rinocerontes e Araras já viraram abajur faz tempo.
 
Hoje li uma notícia que um dos videogames da nova geração vem com um aplicativo que pode transmitir através de uma webcam embutida vídeos de suas jogatinas, só que fora usada para mostrar ao vivo e a cores (cor de pele predominava) o despir de uma mulher causando o bloqueio do tal jogador.  A mulher em questão era sua esposa e estava embriagada, com cara de tontinha pelo álcool. O dito cujo expôs sem qualquer pudor o corpo violão da sua garota para deleite dos que estavam com o joystick na mão.  Além do abuso e da falta de cuidados para o patrimônio da casa noto que essa pessoa conseguiu novamente dar uma utilidade impensada pelos criadores da PSN. Mas não adianta: No que o homem põe a mão ele o manipulará para seu bel-prazer. Pode ser a criação mais ingênua e bonita do mundo que se transformará em uma máquina instantânea de lasciva, fofoca, assassinato, ou ainda manipulação. Sempre seremos babacas, por isso sempre que você for fazer qualquer coisa na internet tenha todo o cuidado possível. Mesmo com isso não é garantia nenhuma. As pessoas jubilam esse lado de achar graça da desgraça alheia. Mais uma subversão para a nossa lista. Talvez exista apenas uma coisa que não possa ser transviada e esse homem, se a menina for esperta, vai sentir na pele que certas coisas não tem choro nem vela: A Confiança. Perdeu, bota fora que não recicla.

Dia da Consciência Humana

on quarta-feira, 20 de novembro de 2013


Parabéns, negão! Parabéns, branquelo! Japinha, fala aí! Narigudo, magricelo, bipolar e você também, orelha de abano. Como tão?  Gordinha sensual, aquele beijo pra ti. Não gosto muito de escrever sobre temas batidos, daqueles que todo mundo dá seu pitaco e ninguém chega a lugar nenhum. Muito menos quando eles são apoiados por datas que por si só já fazem do assunto exaustivamente discutidos. Porém, não dá pra não expressar a opinião em algo tão grande.
Acho o Dia da Consciência Negra uma data bonita. Não no sentido de ornamental, pendurar no pinheirinho ou em cima da lareira, essas coisas, mas sim de representação de marco. É importante você aprender a contar os dias e delimitar as vitórias alcançadas. Uma vez por ano as pessoas que tem a pele escura refletem, acho que o tema festejar não cabe aqui visto que é construído em cima de muito sofrimento e combalidas voltas por cima na defesa de seus direitos que foi escolhida essa época do ano, sobre tudo que passaram para conquistar o que não deveria ser privado para ninguém independente do pigmento. Erro histórico. E a conta vai pra quem? Vai para uma sociedade que a cada dia mais se divide, se enfurece e que só é contida pela letra fria da lei.
Assim como o natal não é uma festa em que todos comemoram, os judeus que o digam – que dirá os satanistas – e seu aniversário não é feriado nacional não vejo nenhum problema de homenagearmos um grupo de pessoas que merece os méritos de uma luta brava. Nos dois sentidos. É sem fundamento quem diz que é exclusão um dia só para eles.  Porém não posso me eximir de alicerçar uma opinião que vai jogar um pouco de água nesse bolo. Um pouquinho só, me perdoem.
Se o dia é da Consciência Negra isso quer dizer que só quem é negro deve refletir, conscientizar-se do valor humano? Devemos ser excluídos de pensar porque os negros sofreram tanto nos nossos livros de história e nos jornais de hoje em dia ainda sofrem diferenciação? Ta aí um grande erro. O certo seria falar abertamente sobre o problema e convidar a todos a ter orgulho de uma de nossas etnias. Daí amanhã podemos cantar vivas para os brancos e ainda que tal semana que vem aplaudirmos os índios? Beleza então, combinado no bar, fechou?
Não, Pedro Bó, não estou levantando aquela bandeira do dia do branco porque é óbvio que isso é besteira. Besteira é segregar. Besteira é obrigar. Que BESTEIRA é que eu esteja falando sobre cor sendo que o colorido é tão mais bonito. Morgan Freeman já perguntou antes de mim por que estamos discutindo a cor da pele.
Vou ainda mais longe. Não são as palavras que ferem os direitos, a honra e o respeito. É aquilo que está embaixo acobertado por uma malha de ódio e pura ignorância. Falar para o amigo que ele é “tão negro que é azul” ou “tão branquelo  que é azedo” não é discriminação. Ao contrário, entre amigos acaba em risos. A problemática é algo enraizado. São pessoas com a mente tão fechadas que cabem num envelope e ainda passam por baixo da porta tamanha sua pequenez. Não adianta muito falar para essas pessoas, elas só vão mascarar. Você pode prendê-las, mas elas só vão esconder o que pensam para não entrar em cana. Mas lá no fundo continuarão maquinando palavras mesquinhas e de ódio.
O que mudaria mesmo o mundo seria se fosse possível extirpar a maldade do ser humano e preenchê-la com amor, ternura, amizade e todas essas coisas que colocaram na receita das meninas superpoderosas. Infelizmente não tem como. Porém a sociedade e o governo alimentam a ira e a desigualdade promovendo diferenciação através de cotas que aumentam ainda mais a intolerância. Eu não me digo contra as cotas, para pobres sou favorável embora ainda ache que o dinheiro é mais bem aplicado em educação base, mas isso é xalalá que todo mundo já fala. Não vou perder o tempo hoje nisso.
O que quis dizer nisso tudo é que no dia da Consciência Negra você negro deve se orgulhar de sua luta e você branco (azedo ou não!) não deve se sentir envergonhado de opinar e ajudar a fazer do nosso mundo um lugar mais pensante. Pensante a ponto de ver as falhas nas estruturas e sugerir melhoras. Pensante para verificar os acertos e as medidas para consertar os balanços desiguais da gangorra da vida. Pensante a ponto de ter uma consciência que não dependa da imprensa ou do governo ou do que lhe prejudica ou favorece. Pensante para saber que como em uma aquarela ou uma pintura artística quanto mais cores você tiver, melhor. Você faz sombra, você faz brilho, tom sobre tom e no final você só faz uma coisa: Obra-prima.

A peladona da Feira

on terça-feira, 19 de novembro de 2013


A feira do livro de Porto Alegre é uma das maiores da América Latina das que acontecem ao ar livre, lugar aberto. É o que dizem, também não perguntei pra ninguém do IBGE pra ver se é verdade. O que sei de concreto é que é muito satisfatório saber que temos pelo menos duas vezes ao ano um local onde o foco seja a leitura e onde os holofotes estejam um pouco distantes dos assuntos levianos de sempre. Porém ontem soube e hoje tive a notícia do fato consumado que uma modelo posou nua em plena feira com inscrições em tinta de frases e poemas de grandes pensadores das letras tatuados provisoriamente em seu corpo. A ideia dos gênios pensantes por trás disso era mostrar como a leitura poderia ser algo moderno, dinâmico e não monótono.  Muita gente chiou e uma galera maior limpou a lente de suas câmeras. Não quero entrar em mérito de certo ou errado, pois o tempo e a história já nos demonstraram que tudo um dia cai por terra, até mesmo as tetas balançantes dessa mulher um dia terão o mesmo destino gravitacional. Seja como for o que me surpreendeu disso tudo foi a miopia de último grau em cima do assunto tratado. Muitos gritaram bruxa e pegaram suas armas de inquisição medievais (existem pensamentos tão retrógrados quanto esses artefatos) para acusações em cima da peladice da dona, enquanto que outros só queriam um lugarzinho na fila da leitura corporal. Teve até gente bancando o cego para ler em braile.  Porém choca  poucas pessoas preocupadas com a mensagem errônea que se quer passar. Ler não é algo tão ruim que só possa ser melhorado no corpo de uma Globeleza da vida. Capaz. Ler é tudo de bom.
A intenção pode ser boa, mas a mensagem que ela quer passar está meio torta. Está despida de sustância, está tão nua quanto a peladona.  Ler é legal independente da forma, nisso concordo, porém ler os poemas de Mario Quintana no corpo de um mulherão é para um homem um pedido dos versos de” ignore-me”, por melhores que eles sejam. Leitura não tem nada de “descolado”, tanto que ela é feita em particular e para o próprio deleite e não em uma rave ou orgia. É um modo permitido por nós mesmos de voltar a ser careta. Seja pelos estilos de leituras antigas com sua formas não coloquiais e românticas de um jeito que o mundo não o é mais quanto pelo fato do atrativo desse hobby ser mais duradouro do que baladas e drogas de celebridades. Pois então, a proposta pareceu-me aqueles livros didáticos que enchem o material de ilustrações coloridas numa tentativa de associação com o conteúdo, mas que resulta apenas numa distração e enche nosso HD cerebral com uma vasta gama de figurinhas repetidas. 
 Acho incrível nos dias de hoje a maleabilidade da nudez. Claro que é legal, um corpo de revista top de linha é sempre agradável aos olhos, mas concordo com quem diz que tem lugar. A proposta da moçoila era de mostrar que a leitura pode ser mais descolada. Porém nudez é sinal de ser legal? Nunca soube. E é óbvio que as pessoas sabem que dá pra ler coisas legais desse tipo: Existe Playboy.