A peladona da Feira

on terça-feira, 19 de novembro de 2013


A feira do livro de Porto Alegre é uma das maiores da América Latina das que acontecem ao ar livre, lugar aberto. É o que dizem, também não perguntei pra ninguém do IBGE pra ver se é verdade. O que sei de concreto é que é muito satisfatório saber que temos pelo menos duas vezes ao ano um local onde o foco seja a leitura e onde os holofotes estejam um pouco distantes dos assuntos levianos de sempre. Porém ontem soube e hoje tive a notícia do fato consumado que uma modelo posou nua em plena feira com inscrições em tinta de frases e poemas de grandes pensadores das letras tatuados provisoriamente em seu corpo. A ideia dos gênios pensantes por trás disso era mostrar como a leitura poderia ser algo moderno, dinâmico e não monótono.  Muita gente chiou e uma galera maior limpou a lente de suas câmeras. Não quero entrar em mérito de certo ou errado, pois o tempo e a história já nos demonstraram que tudo um dia cai por terra, até mesmo as tetas balançantes dessa mulher um dia terão o mesmo destino gravitacional. Seja como for o que me surpreendeu disso tudo foi a miopia de último grau em cima do assunto tratado. Muitos gritaram bruxa e pegaram suas armas de inquisição medievais (existem pensamentos tão retrógrados quanto esses artefatos) para acusações em cima da peladice da dona, enquanto que outros só queriam um lugarzinho na fila da leitura corporal. Teve até gente bancando o cego para ler em braile.  Porém choca  poucas pessoas preocupadas com a mensagem errônea que se quer passar. Ler não é algo tão ruim que só possa ser melhorado no corpo de uma Globeleza da vida. Capaz. Ler é tudo de bom.
A intenção pode ser boa, mas a mensagem que ela quer passar está meio torta. Está despida de sustância, está tão nua quanto a peladona.  Ler é legal independente da forma, nisso concordo, porém ler os poemas de Mario Quintana no corpo de um mulherão é para um homem um pedido dos versos de” ignore-me”, por melhores que eles sejam. Leitura não tem nada de “descolado”, tanto que ela é feita em particular e para o próprio deleite e não em uma rave ou orgia. É um modo permitido por nós mesmos de voltar a ser careta. Seja pelos estilos de leituras antigas com sua formas não coloquiais e românticas de um jeito que o mundo não o é mais quanto pelo fato do atrativo desse hobby ser mais duradouro do que baladas e drogas de celebridades. Pois então, a proposta pareceu-me aqueles livros didáticos que enchem o material de ilustrações coloridas numa tentativa de associação com o conteúdo, mas que resulta apenas numa distração e enche nosso HD cerebral com uma vasta gama de figurinhas repetidas. 
 Acho incrível nos dias de hoje a maleabilidade da nudez. Claro que é legal, um corpo de revista top de linha é sempre agradável aos olhos, mas concordo com quem diz que tem lugar. A proposta da moçoila era de mostrar que a leitura pode ser mais descolada. Porém nudez é sinal de ser legal? Nunca soube. E é óbvio que as pessoas sabem que dá pra ler coisas legais desse tipo: Existe Playboy.

0 comentários: